DADOS HISTÓRICOS SOBRE O
PARQUE NACIONAL DA GORONGOSA
- I -
1968 - Armando Rosinha
Relatório do Dr. Armando Rosinha, que foi administrador do PNG de 1965 a 1967, em acumulação de funções com as de chefe da Repartição Distrital de Veterinária de Manica e Sofala.
Este relatório foi publicado em 1968, nos Anais dos Serviços de Veterinária de
Moçambique, nº 16, págs. 161 a 174 e constitui o documento oficial mais completo que foi
elaborado até àquela data, relacionado
com a história do Parque Nacional da Gorongosa.
(Prima a tecla Ctrl e ao mesmo tempo use o scrol (roda do rato) para aumentar o texto)
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Ver também em: http://www.gorongosa.net/pt/page/1968_Armando_Rosinha/1968--armando-rosinha
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- II -
1981 - Armando Rosinha
Comunicação apresentada pelo autor na 1ª Conferência Nacional sobre Fauna Bravia, realizada em Dezembro de 1981, no Chitengo – Parque Nacional da Gorongosa- e publicada na revista Arquivo, Maputo, Nº 6, págs. 211 a 238.
ALGUNS DADOS HISTÓRICOS SOBRE O
PARQUE NACIONAL DA GORONGOSA
Armando Rosinha
1. INTRODUÇÃO
Relativamente ao Parque Nacional da Gorongosa julgamos que
já se pode falar em
história duma área de conservação de fauna bravia pois,
embora ele possua apenas
escassos 21 anos como Parque Nacional, conta já com largos
60 anos desde que, em
parte da sua actual área, foi criada uma "Reserva de
Caça".
Assim, dividiremos a vida do Parque Nacional da Gorongosa em
períodos
correspondentes às fases por que foi passando, podendo
considerar as seguintes:
1ª — Fase da "Reserva de Caça", sob jurisdição da
majestática e
colonial "Companhia de Moçambique" (de 1921 a
1948).
2ª — Fase ainda como Reserva de Caça, agora já sob
jurisdição do governo colonial,
através da chamada "Comissão Central de Caça" (de
1948 a 1960).
3ª — Fase do Parque Nacional, sob jurisdição dos Serviços de
Veterinária coloniais
(de 1960 a 1975, data da Independência Nacional). '
4ª — Fase actual, após a Independência Nacional (de 1975 até
a presente data).
Por razões facilmente compreensíveis, iremos ocupar-nos
apenas da história das três
primeiras fases — que no fundo serão aquelas que já hoje se
podem considerar como
históricas — deixando a fase que estamos vivendo para mais
tarde, e certamente para
pessoa melhor qualificada para fazê-lo.
2. O MOVIMENTO INTERNACIONAL PARA A PROTECÇÃO DA FAUNA
BRAVIA
Desde os tempos mais recuados que os animais selvagens vem
sendo as principais
vitimas do homem, ou porque constituem para ele uma fonte de
alimentação, ou porque
lhe proporcionam
materiais para seu vestuário e adorno, ou ainda
por lhe fornecerem a matéria-prima necessária
a
confecção de vários artigos de carácter utilitário e
para a confecção de valiosos objectos artísticos
ou, finalmente, para lhe servir de desporto.
Em consequência, estando os animais bravios
em perigo de total extermínio, impunha-se a
tomada de medidas de protecção adequadas
e, portanto, não surpreende que as primeiras
providencias que surgiram em muitos países e
territórios fossem precisamente de protecção à
fauna bravia.
A acção, que hoje abrange todo o mundo, no
sentido de preservar os elementos da fauna e da
flora, meio ambiente, etc. — ou seja, o movimento
de protecção da natureza — acabou também por
atingir a África colonizada.
Como se sabe, foram as destruições
crescentes e indiscriminadas dos componentes
da fauna e da flora, causadas pelo homem
— destruições que por vezes apresentavam
aspectos alarmantes — que serviram de aviso
e estimularam os espíritos mais esclarecidos a
tomarem posição contra esse estado de coisas.
A noção do perigo de extermínio de muitas
das actuais espécies faunísticas e florísticas
— facto que a verificar-se acarretaria prejuízos
irreparáveis para a ciência — tornou-se dia a
dia mais clara, desenvolveu-se, expandiu-se e
conduziu a que se tomassem medidas gerais de
protecção a flora e a fauna, não apenas na Europa
e na América mas também em ou tros continentes,
incluindo África.
Criaram-se então, em África, vários Parques
e Reservas para a protecção da fauna e da flora,
antes e depois da Conferência para a Protecção
da Fauna e da Flora Africanas, realizada em
Londres em 1933, e sem esquecer que algumas
dessas Reservas de protecção a fauna são
mesmo anteriores até à Convenção Internacional,
também de Londres, de 1900.
E provável que as primeiras disposições
oficiais de protecção à fauna, no Moçambique
colonial, tenham surgido durante a segunda
metade do século XVIII, pelo menos para algumas
das espécies que eram mais cobiçadas pelos
seus despojos, visto ter sido antes e durante
esse século que o "marfim" e as "peles"
se
encontravam entre os artigos mais altamente
procurados pelos aventureiros, na ânsia de
enriquecerem rapidamente.
A protecção a fauna iniciou-se com
os "Regulamentos de Caça", e o mais antigo
que se conhece e o de 1893, que diz respeito ao
território de Manica e Sofala (Decreto de 27 de
Junho, B.O. nº 40).
O Decreto de 28 de Dezembro de 1903, publicado no B.O. nº.9,
de 27 de Fevereiro
de 1904, aprovou o "Regulamento de Caça" no
Distrito de Lourenço Marques. Este
mesmo "Regulamento, depois de modificado, foi posto em
vigor para toda a Província
de Moçambique, por Decreto de 2 de Junho de 1909, B.O.
nº.33, de 14 de Agosto de
1909.
Aceita-se, no entanto, ter sido apenas em meados do século
XX que alguns homens
esclarecidos se reuniram para clamar contra a situação dos
"Recursos Naturais",
perante as constantes destruições que estes vinham a sofrer.
Sob o ponto de vista científico, a criação e manutenção de
Parques e Reservas
reveste-se de um significado que nem sempre é inteiramente
compreendido. E isto
porque muitos podem, a primeira vista, julgar que a ciência
se poderia contentar com as
montras e dioramas dos museus, ou mesmo com os modernos
jardins zoológicos que
se espalham por quase todas as grandes cidades do Mundo.
Sucede, porem, que nos
museus só é observável a expressão estática de uma vida que
passou, quando o que
realmente importa estudar é o dinamismo e realidade da vida
presente.
Quanto aos jardins zoológicos eles permitem, de facto, que o
cientista se limite a ver
os animais como seres isolados — que afinal não são — sendo
assim impossível situá-
los no seu ambiente natural, no seu "habitat",
encarando-os portanto a luz de todos os
aspectos que encerram, e a organização social de que
desfrutam.
É pois bastante recente a existência de uma consciência
generalizada sobre a
necessidade científica de se poder dispor de Reservas
Zoológicas ou Botânicas, se bem
que, há muito tempo já, outros motivos tenham conduzido a
preconizar variadas formas
de protecção a natureza.
Já Platão, na antiga Grécia, falava sobre o povoamento
florestal das Colinas da
Ática, e Plinio afirma que foi Fluvius Lupinius quem
primeiro, na Roma antiga, imaginou
Parques para javalis e outros animais das florestas, logo
imediatamente secundado por
Luculus e Hortensius.
Durante a Idade Media determinou-se que certas espécies
animais ou florestais não
podiam ser abatidas pelo chamado "povo miúdo" e,
em 1575, o Príncipe de Orange, na
Holanda, comprometeu-se, diante do juiz de Haia, a manter
"perpétuamente intacto o
bosque da cidade".
Três séculos passados, em 1853, um grupo de pintores
franceses conseguia a
protecção da lei para uma parte da floresta de Fontainebleu
e, em 1872, três norte-
americanos obtiveram o mesmo resultado para o que é hoje o
celebre Parque de
Yellowstone.
Julga-se assim que a primeira reserva natural terá sido
estabelecida em 1853, quando
aquele grupo de activistas franceses conseguiu que uma parte
da floresta de Fontainebleu
fosse colocada sob a protecção da lei, a fim de manter
intacta a sua beleza..."
Idêntico desejo levou os três americanos, em 1870, na região
de Yellowstone, depois
de verificarem as devastações praticadas, a concluírem haver
necessidade de conservar
e proteger
aquela região como "a public park of pleasure ground for benefit and
enjoyment
of the people...", tal como é definida na lei de 1 de
Março de 1872, que estabeleceu o
primeiro "Parque Nacional" dos Estados Unidos.
Depois, perante o entusiasmo dos escritores do século XVIII,
apareceu Alexander von
Humboltt, que surge como o promotor da ideia de
"protecção da natureza" e, ao mesmo
tempo, no domínio das ciências naturais, da "teoria
ecológica" que persiste até aos nossos
dias. Foi ele o primeiro a usar o ter mo "monumento
natural", para exprimir que a natureza
produz aspectos notáveis que convém respeitar e proteger.
Posteriormente, em 1902, efectuou-se uma Convenção relativa
à protecção das aves,
a qual veio, em 1954, a ser substituída pela "Convenção
de Paris".
Em 1933, efectuou-se em Londres uma convenção para protecção
da fauna e flora
africanas. Em 1942, também em Londres, realizou-se uma
Conferência Internacional para
a "protecção da natureza no hemisfério ocidental".
Depois disso são realizadas inúmeras
conferências e reuniões, como a de 1949 em Lake Sucesse, e a
de Outubro de 1953 em
Bukavu...
0 conceito de "Parque Nacional" foi primeiramente
descrito na "Convenção para a
Preservação da Fauna e Flora e Belezas Naturais Panorâmicas
das Nações da América",
assinada em Washington em 12 de Outubro de 1940.
A diferença entre "Parque Nacional" e
"Reserva" reside em que o primeiro deve ser
administrado e manejado pelo governo central e está aberto
ao publico, enquanto que a
Reserva pode ser regional ou privada e estar, eventualmente,
vedada ao publico. Hoje,
existem no mundo mais de um milhar de Parques Nacionais e
áreas análogas sendo,
portanto, o primeiro o de Yellowstone, em 1873, e depois na
Suíça em 1914, em Espanha
em 1915, e na Itália em 1930.
Conhecem-se 4 parques nacionais internacionais: o Vale de
Odessa H.Park, com
lado francês e lado espanhol; o W.National Park, com lados
no Níger, Benin e Alto Volta;
o Water ton Glacier International Park, entre os Estados
Unidos e o Canadá; e o Tetras
N.Park entre a Polónia e a Checoslováquia.
Quando em 1872, foi proclamado o 1º Parque Nacional em
Yellowstone, os seus
objectivos eram: opor-se a exploração pelo homem, com o
objectivo de conservar
espécies e ecossistemas ou paisagens; conseguir que os
visitantes obtivessem
benefícios diversos (recreativos educativos e culturais);
aproveitar essa conservação
para efectuar estudos científicos que não podiam realizar-se
noutro lugar.
É sabido que, entre essas três motivações, predominou a
segunda no espírito dos
precursores de 1872, "estabelecido como parque publico
ou terreno de recreio para
beneficio e desfruto da população".
Em Varsóvia, em 1960, funda-se a "Comissão
Internacional de Parques Nacionais
da UICN" e esta introduziu, no que se refere às áreas
protegidas, um mínimo de ordem
em matéria de classificação ou nomenclatura. Primeiro,
escolheu 4 critérios: Estatuto;
Superfície; Pessoal e orçamento, destinados a permitir a
selecção dos territórios
que mereciam ser citados num "quadro de honra",
criado em 1959, pelo Conselho
Económico e Social das Nações Unidas.
A "Comissão" publicou duas versões, uma em
francês, em 1967, e outra em inglês,
em 1971, da lista das Nações Unidas dos Parques Nacionais e
Reservas análogas,
seguidas de uma mais recente actualização.
Por ultimo, essa "Comissão" trabalhou
afincadamente para que a Assembleia Geral
da UICN aceitasse a votação de um texto em que se definia o
conceito de Parque
Nacional, o que foi feito em 1969, em Nova Delhi.
Como e sabido, essa definição compreende 5 condições,
fundamentais: ampla
extensão, conteúdo notável, regime de protecção eficaz e
gestão e criação pela mais
alta autoridade competente do Pais, e turismo autorizado.
O termo "Parque", na sua origem inglesa,
aplicava-se aos bosques isolados, não
produtivos, mas administrados e não necessariamente votados
à protecção. No entanto
pode supor-se que o termo "Parque" implicava a
ideia de uma Reserva para visitantes.^
0 conceito, no seu aspecto central, consistia em não
interferir, e em não explorar, mas
em permitir o acesso do público para desfruto da natureza.
0 significado do sufixo "nacional" é mais claro,
mas tem um sentido duplo. Em
termos de qualidade implica que o Parque oferece
características de importância
superior a local, ou inclusive a regional ou provincial, que
se destacam entre os
melhores exemplos desta índole dentro do território nacional
e constituem uma valiosa
contribuição para o património mundial.
É nesse sentido que os Parques Nacionais merecem a selecção,
a protecção e a
supervisão contínua, ao mais alto nível nacional, sendo
mantidos por e para a Nação, com
respeito a disposições muito restritas quanto à sua
alienação jurídica ou alteração.
0 conceito de "Parque Nacional" começou a
desenvolver-se há um século, quando
se observou em certos Países que, por causa das necessidades
e pressões humanas,
algumas espécies de plantas e de animais começavam a
desaparecer e que determinadas
características de importância geológica e arqueológica,
eram alteradas por forças
poderosas.
O conceito de "Parque Nacional" permitiu então
separar amplas extensões de
terreno, em forma de zonas selvagens ou naturais.
Considerou-se que esses territórios,
com a sua variedade de aves, mamíferos, peixes e diferentes
camadas de vegetação,
abandonados a si mesmos e desprovidos de qualquer influencia
humana, chegariam a
encontrar um "equilíbrio da natureza". O objectivo
era conceder a protecção completa a
zonas representativas de um meio submetido a rápidas
mudanças. Naquela época, o "meio
ambiente" da maioria dos Países em desenvolvimento
quase não havia sido afectado pela
influencia da industria.
Os recursos animais, as peles e seus produtos, não eram mercadorias
importantes no
comércio mundial, ou se o eram em certos casos, recebiam
menos atenção que o comércio
de escravos que era o centro de atenção das discussões da
época.
0 século XIX foi um período significativo da exploração
activa em muitas partes do
mundo. A população humana era bastante reduzida, e muitos
povos do Mundo viviam
da caça, pesca ou simples colheita de mel, frutos, raízes e
vegetais. Os animais bravios
deslocavam-se a vontade nas suas rotas tradicionais de
migração, sem grandes obstáculos.
Os instrumentos usados para caçar eram de carácter rústico,
e em consequência, não
podiam usar-se perigosamente ao ponto de ameaçar ou
prejudicar uma espécie através da
caça.
0 progresso do homem e das armas e sua utilização, e a
descoberta da espingarda
significaram o início de uma nova era para a caça de animais
bravios e para o homem. E a
partir dai, tudo mudou.
É um facto que, em outras eras, as colectividades que pescavam e caçavam o
faziam para se abastecerem a si próprias e as suas famílias, com alimentos e roupas,
mas a exploração comercial actual ameaça a própria existência de numerosas espécies
possuidoras de peles e troféus valiosos, tanto a nível nacional como mundial.
Em muitas partes da África o conceito de "Parque
Nacional" foi influenciado
poderosamente pela Convenção de Londres de 1933, que tendia
a salientar que, dentro
do possível, a exclusão de toda a actividade humana manteria
os Parques Nacionais
intactos e sem modificações notáveis. No entanto, na
conservação das zonas naturais,
esse objectivo não conseguiu resistir a prova do tempo.
É um facto biológico que as sãs populações de plantas e
animais evoluem até um
ponto culminante e sempre se produzem mudanças naturais de
flora e fauna, que fazem
com que, ao cabo de uns poucos de anos, nenhuma zona seja,
na realidade, igual.
Mesmo nos museus, monumentos, etc, a politica de não
tocar" não chega para
assegurar a conservação de exemplares mortos!
Precisamente este processo continuo de trocas entre a
natureza, e os erros
cometidos nos países desenvolvidos, levaram os países em
desenvolvimento de muitas
partes do Mundo a realçar o "maneio e investigação dos
recursos" como um importante
aspecto no conceito de Parques Nacionais.
Para se poder estabelecer um "maneio" adequado,
num "Parque Nacional", torna-se
necessário, portanto, investigar os respectivos recursos,
pela forma seguinte:
—
Fazer investigações sobre o solo, que abarquem a análise do
mesmo e a
determinação da sua humidade e temperatura;
—
Estudar a sociologia das plantas, estabelecendo transições e
empregando a fotografia aérea para descobrir as tendências
da vegetação por
comparação com fotografias tiradas em estações diversas.
—
Estudar o efeito das "queimadas", seus usos e
forma de luta contra os
incêndios voluntários e descontrolados.
—
Estudar os sistemas de raízes para descobrir a influência
que exercem
sobre a presença de ervas e outras plantas.
—
Efectuar estudos meteorológicos em diferentes tipos de
vegetação, que
compreendam a pluviosidade, as temperaturas do ar, a
humidade relativa, a saturação e
ventos (direcção e velocidade).
—
Efectuar estudos de ecologia animal, que abranjam o maior
número
possível de espécies.
Só depois de dispor de ampla informação as autoridades dos
Parques Nacionais
poderão adoptar decisões responsáveis que conduzem a boas
práticas de conservação.
A Xª Assembleia Geral da UICN, que se reuniu em Novembro de
1969, em Nova
Delhi, adoptou uma resolução contendo a definição do termo
“Parque Nacional”.
Em face da importância reconhecida aos "Parques
Nacionais" pela Nações Unidas",
tanto no aspecto do emprego judicioso dos recursos naturais
como na utilização crescente
nos últimos anos, que é feita em certos Países da expressão
"Par que Nacional" para
designar territórios com estatuto e objectivos cada vez mais
diferentes, à 10ª Assembleia
Geral da UICN, reunida em Nova Delhi em Novembro de 1969,
recomenda que os
Governos de todos os Países aceitam reservar a designação de
"Parque Nacional" para os
territórios correspondendo às características abaixo
indicadas e assegurar que os poderes
locais e as organizações privadas desejando constituir
reservas naturais façam o mesmo:
Um Parque Nacional é um território relativamente extenso:
1)
que apresenta um ou vários ecossistemas, geralmente pouco ou
nada
transformados pela exploração e ocupação humana, em que as
espécies animais ou
vegetais, os locais geomorfológicos e os habitats apresentam um interesse especial do
ponto de vista cientifico, educativo, e recreativo, ou nos
quais existam paisagens naturais de
grande valor estético, e
2)
no qual a mais alta autoridade competente do Pais tenha
tomado medidas
para impedir ou eliminar, desde que possível, em toda a sua
área, essa exploração ou essa
ocupação, e nela fazer, efectivamente, respeitar as
entidades ecológicas, geomorfológicas
ou estéticas, que hajam justificado a sua criação, e
3)
no qual a visita é autorizada, sob certas condições, para
fins recreativos,
educativos e culturais;
De qualquer forma os "Parques Nacionais" não devem
ser considerados como
empresas comerciais, mas sim como um serviço público (como
os museus e galerias de
arte), embora muita gente os valorize apenas como fonte de
divisas estrangeiras.
Em 1950, quando iniciámos a nossa vida profissional como
veterinários em
Moçambique — desconhecendo quase em absoluto o problema em
causa — viemos
encontrar
ideias, generalizadas a técnicos e responsáveis e, de um modo geral, a toda a
gente, que assentavam nas seguintes bases fundamentais:
— O progresso da Agricultura e da Pecuária era seriamente
entravado pela presença de
Glossinas, em grande parte do território;
-
A existência das Glossinas estava íntima e decisivamente
ligada à
presença de uma abundante e variada fauna bravia;
-
A melhoria da Pecuária, especialmente nos seus aspectos
qualitativos e
quantitativos, só poderia verificar-se desde que a fauna
bravia fosse dizimada — como
medida de saneamento e nas planícies e florestas passariam,
depois, a poder viver
tranquilamente os tão desejados e necessários animais
domésticos;
-
Ou "caça", ou "gado", era o slogan,
apregoado aos quatro ventos, e
interpretado, na ocasião, como querendo expressar que, para
haver "gado", se tornaria
necessário destruir todos os animais bravios.
O que sucedeu, porém, foi que, mercê da publicação do
célebre Decreto nº 40.040,
em 1955, os assuntos respeitantes a fauna bravia foram, como
todos sabemos,
entregues pelo Governo Colonial aos Serviços da Veterinária
e Industria Animal de
então...
Isto equivale a dizer que, ao tempo, os serviços oficiais
responsáveis pela Pecuária
— e pela Fauna também, portanto — apoiados decididamente
pela opinião publica
generalizada, aceitavam com bons olhos, e desejavam mesmo, o
extermínio puro e
simples da enorme riqueza constituída pelos animais
selvagens que habitavam ainda, e
felizmente, grande par te do território da então colónia de
Moçambique.
E, se os Serviços oficiais responsáveis pela fauna bravia,
pensavam assim, não
é de estranhar que os restantes — Administrativos, de
Agricultura, de Saúde, etc. —
ainda fossem mais extremistas, dai resultando as enormes
dificuldades pelas quais
a "conservação" teve que passar sempre, sendo
portanto a causa de muitas situações
desagradáveis verificadas.
3. PARA A HISTÓRIA DO PARQUE NACIONAL DA GORONGOSA
a) Fase da "Reserva de Caça" sob jurisdição da
majestática e colonial
Companhia de Moçambique
Os documentos mais antigos a que tivemos acesso
informam-nos que a base da
existência da "Reserva da Gorongosa" se encontra
num despacho de 18 de Outubro
de 1920, do então governador da Companhia de Moçambique,
Pery de Linde, no qual
determinava: "Convindo reservar a maior parte da
Circunscrição (Gorongosa) para a
caça somente, desejo que o Chefe de Serviços de Agrimensura
informe sobre o assunto
o que se lhe oferecer.
Foi pois em consequência deste despacho, que posteriormente,
se determinou uma
área de cerca de l.OOOKm2 destinada à protecção da fauna na
Gorongosa (Portaria de 2
de Março de 1921), superfície mais tarde ampliada para
3.200Km2 , por se ter verificado
que a primitiva "Reserva" não abrangia as áreas
normalmente habitadas por duas
espécies animais consideradas muito importantes — o
rinoceronte e a inhala — (Decreto
nº 26076 de 21 de Novembro de 1935).
Este Decreto aprovou um Regulamento de Caça da Companhia de
Moçambique e foi
no seu art. 10º que ficou estabelecido o seguinte: "É
actualmente "Reserva de Caça" uma
Coutada única, na circunscrição da Gorongosa, tendo como
limites... etc".
Parece portanto poder deduzir-se que esta "Reserva de
Caça da Gorongosa não
funcionava, de facto, como área de protecção total à fauna
bravia, mas sim como zona
reservada para a caça por parte dos privilegiados e dos seus
convidados. .. Isto é
confirmado, por exemplo, por um documento de 1935, de que
tivemos conhecimento
na Beira, aquando da nossa estadia à frente da Repartição
Provincial de Veterinária
de Manica e Sofala (de 1963 a 1967), e no qual a Direcção da
Companhia, dirigindo-
se ao Administrador da Circunscrição da Gorongosa (ao tempo,
também o responsável
pela "Reserva"), em confidencial, informava que:
"estando prevista para breve a visita
à Beira do Cruzador Britânico "CARLISLE", e
constando do programa organizado
para a respectiva, oficialidade uma caçada nos tandos da
Gorongosa, e sabendo-se
que, ultimamente, se vem verificando desmandos e
transgressões de caça, naquela
área, recomenda ao Sr. Administrador medidas adequadas para
que aqueles ilustres
convidados não vão encontrar os animais muito dispersos e
muito excitados, o que lhes
dificultaria o desejado êxito na caçada..."
Sabe-se, também que Presidentes da Republica Portuguesa,
como os Generais
Carmona e Craveiro Lopes, realizaram caçadas oficiais nas
áreas da Gorongosa.
A "Reserva" ficou, após a sua criação, a cargo da
Administração da Circunscrição,
em Vila Paiva, e foi sob a orientação daquela entidade que,
ao tempo, foi construída a
estrada ligando Vila Paiva ao "tando".
No local onde se encontra o Chitengo ficou a residir, numa
palhota, um guarda da
Reserva, o "indígena" José Ferreira.
No ano de 1935, foi nomeado fiscal da Reserva o Sr. José
Henriques Coimbra,
que se fixou também no Chitengo, e em palhota, com a sua
família, tendo o guarda
Ferreira passado então para as funções de guia de
visitantes. O acampamento do
Chitengo passou a desenvolver-se, construindo-se as
primeiras casas sob orientação
do fiscal Sr. Coimbra, que abriu também o primeiro poço para
o abastecimento de
agua. O fiscal Sr. Coimbra, viveu no Chitengo de 1935 a
1942, tendo depois, devido a
um acidente que o incapacitou temporariamente, sido
transferido para a Beira, embora
continuando como encarregado da Reserva.
Foi também por essa altura que o Comandante da Policia da
Beira, considerado
como um grande entusiasta da Gorongosa — o capitão Pinto
Soares — com o
caçador Sr. Alberto de Araújo e o Figueira Meque — ainda
aqui junto de nós e a
trabalhar pelo seu Parque — deram inicio a abertura dos
alicerces para implantação
das construções ainda hoje existentes no portão da entrada,
do lado de Bue Maria.
O chamado "acampamento velho", no tando do Songo,
também conhecido
por "Casa dos Leões", foi construído em 1940, por
um pedreiro indo-portugues,
de nome Costa, e sob orientação do fiscal Sr. Coimbra. Este
acampamento foi
abandonado dois anos depois por se ter verificado que o
local onde estava implantado
ficava sujeito a inundações na época das chuvas, uma das
quais "meteu agua" ate ao
nível do forro das casas...A partir do abandono, famílias de
leões ocuparam as casas,
os terraços e as sombras, o que passou a constituir uma das
atracções turísticas mais
apregoadas da Gorongosa.
O comentário que nos merece esta primeira fase do nosso
Parque Nacional da
Gorongosa, é o de que, embora os objectivos que levaram a
criação da "Reserva"
não tivessem, como já se disse, predominância
proteccionista, a verdade é que deles
resultou qualquer coisa de útil, preservando-se para o
futuro uma área, e a sua fauna,
de inegáveis valores naturais.
É bom não nos esquecermos de que Companhia de Moçambique era
uma
empresa de exploração e que, dentro desses objectivos,
explorou de facto, e em
grande escala a fauna bravia.
Aproveitando-se dos "mitos" como os dos
"animais ferozes", "animais daninhos",
e das realidades da existência de grande número de
"caçadores profissionais", e da
oficializada e rendosa exportação sistemática do
"marfim", dos "cornos de rinoceronte"
e peles, a Companhia de Moçambique iniciou o grande desbaste
que sofreu a fauna
bravia no território de Manica e Sofala, outrora considerado
o mais elevado expoente,
em Moçambique, daquilo a que chamavam, falando da África em
geral, o "paraíso dos
caçadores"...
Num folheto de propaganda — "A Caça em Moçambique"
— editado em 1938
pela Repartição Central de Estatística, encontramos a
seguinte e expressiva
referencia: "Se a África é o paraíso dos caçadores,
Moçambique é um dos mais
privilegiados recantos desse paraíso. Nas suas florestas,
nos seus ' tandos' e 'lânguas',
nas margens, restingas e ilhotas nos seus rios e lagoas, uma
fauna riquíssima em
variedade e abundância se oferece, tentadora, ao caçador. O
território da Companhia
de Moçambique é, entre todos os da Colónia, aquele que goza
da fama de possuir
mais caça. São, na verdade, notáveis os celebres 'tandos' ou
'dambos' da Gorongosa,
extensíssimas planícies onde os boi-cavalos, as zebras, os
leões, os búfalos, os
elefantes e muitas espécies de antílopes se contam por
milhares. É a zona da colónia
mais frequentada por turistas estrangeiros, amadores deste
desporto, e a região onde o
caçador, principalmente, mais oportunidade tem de fazer boa
figura".
Igualmente, numa outra monografia — "A Caça em
Moçambique" — apresentada
pela "Comissão de Caça de Moçambique" por ocasião
do IV Congresso do Turismo.
Africano, realizado em Lourenço Marques, em Setembro de
1952, deparamos com
as seguintes passagens, a propósito ainda do território de
Manica e Sofala, e da
Gorongosa: "Poucas zonas de Moçambique reúnem um
conjunto de condições tão
favoráveis á vida dos mais variados animais. Nos seus
3000km2, por feliz distribuição
das linhas de relevo e da variedade da vegetação que aqui se
origina, encontram o
seu 'habitat' próprio animais que vão desde os mais
graciosos antílopes — pouco
maiores do que coelhos, até aos espectaculares 'cambacos' de
pontas a roçarem o
chão. Rica na variedade das espécies, é-o também na
abundância de cada uma. O
número de animais que eu vi, num percurso de uma dezena de
quilómetros no Parque
da Gorongosa — dizia um visitante conhecedor de parques de
caça — não se vê
facilmente noutro lugar!"
b)Fase da "Reserva de Caça" sob jurisdição do
governo colonial através da
Comissão Central de Caça (1948 a 1960)
Em 1948, atendendo ao volume das obras a executar no novo
acampamento de
Chitengo, o Governo, através da "Comissão de
Caça", contratou o Sr. Alfredo Rodrigues
como encarregado das mesmas, tendo posteriormente sido
investido, nas funções de
fiscal de caça, em substituição do Sr. Coimbra.
O delegado da "Comissão de Caça" na área da
Gorongosa continuava a ser o
respectivo Administrador da Circunscrição e assim, era este
quem continuava a dirigir a
Reserva e a orientar mesmo as obras em curso.
Foi também por esta altura que, verificando-se que os
limites, ultimamente
implantados, não serviam satisfatoriamente especialmente por
terem consentido que
a estrada Beira -Rodésia, (a antiga estrada que,
atravessando o rio Pungué, depois
de Gôndola e do rio Urema, ia desembocar na estrada
Beira-Inhaminga, próximo da
Muanza) e determinou que ela ficasse incluída dentro da área
da Reserva e, por esse
motivo, novas propostas se efectuaram até que, finalmente,
ficou assente a criação de
uma cintura de protecção em torno da Reserva, do que
resultou uma área sob defesa
avaliada em cerca de 12.000 Km2.
Em 1957, por concurso publico, foi adjudicado a Sociedade
Comercial de Manica e
Sofala a exploração comercial dos alojamentos existentes —
constituídos, na ocasião,
por quartos, restaurantes e bar — contrato esse que,
posteriormente, transitou
para a Agência de Viagens e Turismo, tendo esta, por sua
vez, mas já em 1964,
sido integrada na recentemente fundada, sob a égide do
poderoso Banco Nacional
Ultramarino, "Sociedade de Safaris de Moçambique",
ou "SAFRIQUE", que chegou até
aos nossos dias.
O fiscal Sr. Alfredo Rodrigues, manteve-se na Gorongosa
durante cerca de 14
anos, e foi ele, sem duvida, quem acompanhou os primeiros
passos da sua fase
de protecção a fauna - com proibição de ali se caçar - e de
expansão turística -
com admissão de visitantes — desenvolvendo trabalho que
chegou a granjear-lhe
apreciável fama, embora tratando-se, de facto, de elemento
quase ignorante da
Ciência Biológica e, portanto, dos autênticos problemas que
envolvem uma área de
protecção.
c) Fase de Parque Nacional sob jurisdição dos Serviços de
Veterinária (1960
a 1975)
Como se sabe, em 1933 efectuou-se em Londres uma
"Convenção para proteger,
em África, o solo, a flora, a fauna e os monumentos
naturais", organizada e participada
por todos os Países que, ao tempo, detinham colónias neste
continente.
A Convenção foi aprovada, ratificada, e Portugal, para lhe
dar cumprimento e
execução, fez publicar em 20 de Janeiro de 1955 o conhecido
Decreto n°40.040, que
passou a vigorar no chamado, ao tempo, "Ultramar
Português", como Lei Geral sobre a
matéria.
Como também é sobejamente conhecido, este Decreto 40.040
introduziu diversas
inovações na protecção da flora, da fauna, dos solos e, ate,
das águas interiores, e na
parte que mais nos diz respeito, estabeleceu que os
problemas da fauna passariam
para a jurisdição dos Serviços da Veterinária, e os
problemas da flora e aguas
interiores para a jurisdição dos Serviços de Agricultura e
Florestas.
É de assinalar, no entanto, que o Decreto 40.040 só teve
implementação em
Moçambique no ano de 1960, data em que, de facto, os
assuntos da fauna foram
transferidos da "Comissão Central de Caça" para os
Serviços de Veterinária, que
criaram a Repartição Técnica da Fauna. E, com eles, passou o
Parque Nacional da
Gorongosa, tendo sido o médico -veterinário Chefe da
Repartição de Veterinária de
Manica e Sofala, Dr. Rodrigues da Costa quem procedeu às formalidades
oficiais
da passagem de responsáveis e dos seus imóveis e moveis
existentes e, por
acumulação, administrou também o mesmo até 1963.
Em Março de 1963, a administração do Parque Nacional da
Gorongosa foi
entregue, também em regime de acumulação, ao Delegado de
Sanidade Pecuária de
Chimoio, Dr. Amadeu C. Silva e Costa, que a exerceu até
Novembro de 1965.
Já então fora criado o Fundo de Protecção a Fauna — com
verbas obtidas através
das receitas próprias do Sector, constituídas pelas taxas e
licenças de caça, produto
de multas aplicadas pela fiscalização e da venda de despojos
e troféus.
E foi precisamente com fundos dessa origem que o Serviço de
Protecção à Fauna
pode dedicar uma apreciável atenção ao desenvolvimento do
Parque Nacional da
Gorongosa, especialmente no seu aspecto turístico.
Na verdade, durante o período de administração do Dr. Silva
e Costa o Parque
Nacional da Gorongosa sofreu notáveis melhoramentos, no que
diz respeito às
instalações do acampamento do Chitengo e outras
infra-estruturas de apoio ao
turismo.
Este, devido não só ao incremento que se verificou face ao
inicio da
chamada "caça turística" ou "safaris de
caça" praticado nas "Coutadas", então criadas
e de cujo numero, de 17, foram, como é sabido, estabelecidas
em Manica e Sofala
na maioria — mas também, — e especialmente, devido à
melhoria das condições de
acesso, pela asfaltagem da estrada Beira-Rodésia e
construção de celebre "ponte
de Tambores" sobre o rio Punguè, em Bué Maria, sofreu,
de facto, um notável
incremento. Bastara dizer-se que o número de turistas
registados, passou de 1.361 em
1952, para 6.096 em 1960, 8.203 em 1965 e 12.219 em 1968.
O acampamento de Chitengo foi pela primeira vez, dotado de
um plano director,
orientado por arquitecto, e ampliado na sua capacidade de
alojamentos, passando a
dispor de luz eléctrica abundante, água suficiente, piscina,
restaurante, bar, correios,
posto sanitário e pista para aterragem de aviões, e cerca de
vedação em arame.
Igualmente, ainda que em fase primária, o Parque Nacional
Gorongosa foi dotado
de algum pessoal privativo, embora destacado de outros
quadros dos Serviços da
Veterinária. Assim foi, que ali passaram a prestar serviço
ajudantes da Pecuária
tratadores de animais e fiscais de caça. Foi durante este
período que iniciou no
Parque Nacional da Gorongosa uma propicia e dinâmica acção
o, ao tempo, fiscal de
caça de Chimoio, Sr. Celestino Ferreira Gonçalves.
De 1965 a 1968, (*) a Administração do Parque passou, novamente
por acumulação,
a ser exercida pelo Chefe da Repartição de Veterinária de
Manica e Sofala (Beira), ao
tempo o Dr. Armando Rosinha, que continuou a ser assistido,
com o seu proverbial
entusiasmo e eficiência pelo fiscal de caça de Chimoio, Sr.
Celestino Gonçalves.
Nessa altura já o orçamento geral do Estado havia previsto o
lugar de Administrador
privativo do Parque, a ser obrigatoriamente desempenhado por
um médico-veterinário,
mas, no entanto, nunca preenchido por não haver candidatos
interessados ao lugar,
dadas as fracas condições de trabalho, de instalações e
mesmo de remuneração de
que o mesmo se revestia.
Ate 1965, portanto, o Parque Nacional da Gorongosa não
dispunha de pessoal
privativo e as suas tarefas estavam entregues, às de
secretaria e contabilidade, ao
pessoal das Delegações de Sanidade Pecuária da Beira ou de
Chimoio, e as restantes
aos ajudantes de pecuária, tratadores de animais dos
Serviços da Veterinária ou
pessoal assalariado eventual (este a maioria) mas sem
qualquer qualificação.
Foi, precisamente nesta fase que redigimos uma informação a
propósito e da qual
transcrevemos o seguinte: "Segundo definição legal,
Parques Nacionais são áreas
sujeitas a direcção e fiscalização oficial, reservadas para
a propagação, protecção
e conservação da vida animal selvagem e da vegetação, e
ainda para conservação
de objectos de interesse estético, geológico, pré-histórico,
arqueológico e de outro
carácter cientifico, em beneficio e para recreação publica e
nas quais e proibido caçar,
pescar, perseguir e espantar animais, destruir ou colher
plantas, salvo por iniciativa ou
sob fiscalização das autoridades competentes, acampar ou
transitar fora dos locais e
caminhos estabelecidos" — (definição do Decreto nº
40.040).
"Em Moçambique, a única área considerada sob esta
jurisdição é o
conhecido "Parque Nacional da Gorongosa", situada
no Distrito de Manica e Sofala,
e cuja fama, projecção e conhecimento, ultrapassaram há
muito o âmbito provincial e
até nacional.
"O Parque Nacional da Gorongosa é, sem duvida uma
realidade, não só sob o
ponto de vista turístico, mas também no aspecto cientifico,
e encontra-se por força do
Decreto Lei nº40.040, sob a jurisdição dos Serviços de
Veterinária de Moçambique.
"Nestas circunstancias, e porque os quase dois anos já
passados nesta
Repartição nos puderam fornecer alguns elementos de
apreciação e conhecimento
dos problemas daquele Parque, entendemos apresentar à
Direcção de Serviços, para
os devidos efeitos e consideração, alguns pontos que
reputamos de fundamental
importância, com vista ao futuro:
"1 — O Parque é um lugar indicado para o estudo da
vida, costumes e relações
existentes entre as diversas espécies animais que nele
vivem, do balanço natural
entre a flora e a fauna, e das relações de equilíbrio que a
natureza mantém,
sabiamente, entre todos os seres vivos de uma comunidade. É
local privilegiado
para a realização de estudos respeitantes a biologia da
fauna, constituindo assim um
verdadeiro" laboratório", onde devem ser colhidos
os elementos indispensáveis para
um controle nacional da fauna das restantes regiões.
"2 — Paralelamente, o Parque e também um local de
turismo, onde os homens
possam ter o direito, respeitando embora os Regulamentos, de
deliciarem a vista
e recrear o espírito na contemplação das belezas da
natureza, entregues a paz e
sossego de uma tranquilidade o mais absoluta possível.
"3 — Mas, fundamentalmente, para além do interesse
turístico, há o interesse
cientifico e o Parque Nacional da Gorongosa deve ser, antes
de mais nada,
“Laboratório de Investigação Cientifica”.
"Aceites como fundamentais estas três premissas,
importa sobremaneira saber
se, na actual estrutura, o Parque estará cumprindo
inteiramente as suas finalidades,
supondo nos que, sem paixão nem intuitos derrotistas de
apreciação injusta, teremos
que concluir afirmando claramente, mas sem hesitação, que o
Parque Nacional
da Gorongosa não está cumprindo a finalidade fundamental que
justificou a sua
criação. Para que essa finalidade estivesse atingida seria
necessário que ali estivesse
montado, alem do sistema em vigor de exploração comercial de
turismo, um serviço
de investigação — que
falta totalmente — dotado dos indispensáveis técnicos
especializados,
com os
conhecimentos necessários à realização de tais estudos.
Torna-se assim urgente, absolutamente urgente, dotar o
Parque Nacional da
Gorongosa de pessoal privativo competente e comportando os
seguintes elementos:
a) Admistrador/Director privativo; b) Guardas de caça; c)
Fiscais de caça; d) pessoal
auxiliar; e e) Pessoal burocrático.
"(Parece não poder haver dúvidas quanto à necessidade
desta providencia, pois
não é de aceitar a situação presente, caracterizada por: a)
Não haver Administrador/
Director privativo; b) Não haver guardas de caça privativos;
c) Não haver fiscais de caça
privativos; d) O pessoal auxiliar ser insuficiente, não
privativo e desqualificado; e) Não
haver pessoal burocrático privativo)".
Trouxemos para aqui esta longa transcrição, duma nossa
Informação de 1966, não
só porque ela exprime um inconformismo, que tem sido
permanente pela nossa parte,
mas também especialmente porque o seu conteúdo ajudará a
compreender algumas
medidas que, posteriormente, foram adoptadas, como veremos.
Entretanto, o desenvolvimento turístico do Parque Nacional
da Gorongosa
prosseguia, sempre como preocupação dominante. 0 Parque será
como que
uma "montra" da Colónia e nenhum visitante oficial
vinha a Moçambique sem que o seu
programa de visita incluísse uma estadia no Chitengo...
Nessa altura, por isso, o Chitengo passou a dispor de
acomodações para receber
cerca de 100 turistas (tendo chegado a alojar 150 em
diversas ocasiões), e um
restaurante que servia 300/400 refeições por dia, um bar bem
abastecido, um salão
para repouso e festas, uma piscina para adultos e outra para
crianças, posto de
abastecimento de combustíveis, posto de socorros, estação
telegrafo-postal, etc. Mas
continuava sem dispor de técnicos, de laboratório, de
biblioteca, de elementos científicos,
enfim, susceptíveis de lhe dar outra feição, para alem da de
empresa hoteleira...
Também se ampliaram as áreas susceptíveis de serem
visitadas, alargou-se a
rede de picadas (de cerca de 150 Km, para perto de 300 Km),
abriram-se picadas para
o Macorreia, para o limite Norte no rio Nhandue, ao longo do
rio Urema na sua parte
terminal, e para as planícies do Ding-Ding.
É altura, portanto, de referirmos algumas das medidas, então
tomadas, e de que
falámos mais acima.
A Direcção dos Serviços, já nessa altura fortemente
pressionada por opiniões
diversas, mas especialmente por sentir
que o Parque Nacional da Gorongosa passara a ser, de facto,
factor de prestigio
pessoal para os próprios dirigentes, tomou as seguintes
decisões, reconhecidamente
acertadas para a época:
1— Organizou o Parque, dotando-o de pessoal privativo
fixado, desde então, no
próprio Chitengo;
2— Nomeou um Administrador privativo, um medico-veterinário vindo de uma
secretaria de Lisboa, bem intencionado sem duvida, mas
completamente ignorante e
alheio aos verdadeiros problemas de um Parque Nacional;
3 — Contratou um ecólogo sul-africano, o Dr. K.L.Tinley,
para proceder aos estudos
de base sobre a fauna bravia do Parque e possibilitar assim
que se publicasse
uma "monografia" sobre o mesmo, reconhecida sempre
como falta importante; A—
Criou o cargo de "guarda de Parques, Reservas e
Coutadas" e preencheram-se
alguns lugares com os elementos colocados no Chitengo; 5 —
Enfim, a secretaria,
contabilidade, aprovisionamento, e outras actividades afins,
ficaram instaladas
definitivamente no Chitengo.
Foi nesta fase que alguns elementos dedicados deram ingresso
nos Serviços da
Fauna e do Parque, e puderam desenvolver acções para alem
das relacionadas com o
sagrado "turismo". Desses, alguns ainda aqui se
encontram hoje, como os Srs. Lobão
Tello, Fernando Costa, Justino Matias, Elija Chamba, Pedro
Manussos, por exemplo.
Foi uma fase importante na vida do Parque, mas muito mais
haverá a dizer sobre
ela, uma vez que nem tudo pode desenvolver-se de acordo com
os programas por
alguns idealizados, o que tem a sua explicação — na nossa
opinião — pela autentica
indefinição de responsabilidades e de objectivos em que
sempre se viveu.
Assim, o novo Administrador não podia, pelas razoes já
aduzidas, ser um autêntico
Director do Parque. A Direcção sobrepunha-se constantemente
ao próprio Serviço da
Fauna, fazendo prevalecer decisões e ideias nem sempre
felizes.
0 ecólogo contratado, sem direcção forte e programa
estabelecido, dentro dos
objectivos para que fora recrutado, lançou-se em trabalhos,
validos sem duvida»
mas carecentes de referência e por vezes, mesmo, afastados
dos mais prementes
problemas do Parque, que assim permaneceram sem solução.
No entanto, o Dr. Tinley lançou-se entusiasticamente no
estudo dos limites
ecológicos do Parque, tendo, logo ao cabo de pouco tempo de
permanência no
Chitengo, apresentado um extenso relatório, de excelente
conteúdo técnico e cientifico
e que veio, realmente, colocar-nos a todos perante novas
concepções, até então quase
que ignoradas pela maioria dos que ali trabalhavam.
Esse relatório, "Parque Nacional da Gorongosa -
Moçambique - Limites Ecológicos
- Manutenção da Natureza Bravia" — foi apresentado ao
Governo, acompanhado por
uma Informação que então elaborámos, e da qual transcrevemos
o seguinte: "1. 0 Dr.
Tinley iniciou os seus estudos no Parque, debruçando-se
sobre o problema dos seus
limites ecológicos, tendo apresentado extenso e valioso
relatório sobre a matéria; "2.
Como é sabido, os limites geográficos do Parque Nacional da
Gorongosa sofreram
já diversas alterações mas nenhuma delas resultante de
estudos tendo em vista
exclusivamente os altos interesses da fauna que o povoa, nas
suas relações com o
respectivo meio ambiente;
"3. Assim é que uma das alterações dos limites tem como
razão principal a
introdução de áreas onde se dizia haver rinocerontes,
espécie que se desejava fosse
valorizar o património faunístico do Parque; outra
alteração, mais recente, teve em mira
retirar do Parque, uma área, do lado da Vila Paiva de
Andrade, densamente povoada
pelo elemento humano;
"4. Os estudos agora efectuados pelo Dr. K.L. Tinley, vieram
"4. Os estudos agora efectuados pelo Dr. K.L. Tinley, vieram
na verdade colocar o problema no seu verdadeiro lugar,
dentro daquilo que, a luz de
princípios científicos universalmente aceites, deverá
entender-se por um autêntico
Parque Nacional;
"5. Nesta conformidade, apresenta no seu relatório uma Proposta
"5. Nesta conformidade, apresenta no seu relatório uma Proposta
para nova alteração dos actuais limites do Parque, baseada
nos estudos hidrológicos
da respectiva área e ainda e outros, factores relacionados
com as regiões limítrofes,
que permitirão constituir, caso venham a ser aceites, um
Parque, segundo o autor
afirma, com características únicas no continente africano;
"6. Resumiremos assim, as conclusões e sugestões
contidas no referido relatório:
a)
— Os estudos da bacia hidrológica do Parque Nacional da
Gorongosa
mostram que toda a sua vida natural depende das nascentes
que abastecem os cursos
de água permanente, que emanam da serra da Gorongosa e,
portanto, para salvar esta
fonte de vida é necessário incluir a maior parte da serra no
referido Parque.
b)
- Atendendo a que as populações humanas que vivem dentro dos
actuais
limites oficiais e as que estão incluídas dentro dos limites
que agora sugere e propõe,
além de constituírem elemento decididamente perturbador do
equilíbrio natural, são
razões suficientes para que, às áreas que ocupam,
deixem de poder, efectivamente,
aplicar-se a própria definição
de Parque Nacional,
consagrada internacionalmente,
e pelo Decreto nº 40.040,
deverão ser retiradas o mais
urgentemente possível.
c) - Tendo concluído que a área da Coutada n°10, constitui o
único refúgio para os
ungulados da "Reserva de Búfalos de Marromeu",
durante a época das chuvas, em que fica
quase totalmente debaixo de água, sugere que aquelas duas
áreas (Coutada n° 10 e
Reserva de Búfalos), sejam incluídas no Parque.
d) - Tendo ainda concluído pela existência de altos
interesses de ordem natural na área
que chamou "enclave de Cheringoma" — que se situa
entre o Parque e.a Coutada nº 10 —
sugere também a inclusão deste "enclave",
providência de que resultaria um conjunto de
ecossistemas excepcional, com áreas da serra, da planície,
do planalto de Cheringoma, e
de zona costeira, único, segundo afirma, hoje praticável em
toda a África.
e) — Atendendo a que a construção da estrada nacional nº 1,
projectada para ligar Vila
Paiva à povoação de Maringue, a seguir pelo lado leste da
serra, dividirá o Parque em duas
partes, com inconvenientes de ordem natural evidentes, deverá
propor-se que a referida
entrada seja desviada para oeste da serra, o que se afigura
vantajosos não só por obviar
dos inconvenientes apontados, mas também por resultar mais
económico, porque apesar
de alongar o trajecto em 3 ou 4 dezenas de quilómetros,
obrigaria a construir, apenas, 4
obras de arte, enquanto que o trajecto do projecto actual
obrigará à construção de 24.
f) — Ainda no que diz respeito ao Parque Nacional da
Gorongosa mas em âmbito mais
particular, propõe as seguintes medidas:
— Que não sejam feitas quaisquer construções, ou
acampamentos, dentro dos seus
limites, - principio que, aliás, preconiza para todos os
Parques e Reservas, devendo antes
aquelas benfeitorias ser localizadas na periferia dos
respectivos limites, de preferência junto
de vilas já existentes, que assim seriam valorizadas com um
novo e forte impulso de
progresso e valorização económica.
- Além de que, sendo tais benfeitorias, (construções para
instalações turísticas),
efectuadas por entidades particulares, deixariam os fundos
do Estado, libertos para
aplicação num mais perfeito conhecimento, controle e
manutenção, da fauna bravia e da
natureza. (Um primeiro acampamento seria construído em Vila
Paiva, um segundo, em
Inhaminga, e um outro na Muanza... ) . — A área a sudoeste,
no sopé da serra, onde já
existem agricultores fixados, não deve ser incluída no
Parque, mas sim e apenas a área
de floresta existente no seu topo. — A missão católica, as
povoações e os
estabelecimentos comerciais existentes, devem ser
transferidos, com as populações das
respectivas áreas.
g) - Finalmente, o relatório, conclui que o futuro dos Parques e
g) - Finalmente, o relatório, conclui que o futuro dos Parques e
Reservas depende de uma fiscalização eficiente e esta só
existirá com bons
profissionais, pelo que se torna necessário formá-los,
pagar-lhes bem e prestigiá-los,
visto só dessa maneira se impedir que os melhores sejam
levados para a actividade
particular, melhor remunerada". Sobre este Relatório, e
na Informação que então
prestámos aos nossos superiores hierárquicos, escrevemos
ainda mais o seguinte:
— "O relatório a que nos vimos referindo, e cujas
conclusões aceitamos na
generalidade, vem colocar-nos perante uma concepção de
Parques e Reservas diferente
da que tem sido seguida em Moçambique.
— As inovações propostas são perfeitamente pertinentes e
oportunas, pois
baseiam-se em estudos com base na Ecologia, e em sãos
princípios de conservação da
natureza.
— No entanto, para as pôr em prática, totalmente, existem
implicações que
transcendem as nossas atribuições e possibilidades.
— Com efeito, o que se propõe em relação ao Parque Nacional
da Gorongosa, a ser
realizado, transformaria aquele já famoso santuário de fauna
bravia numa realidade
indubitavelmente mais valorizada, mas exigiria medidas de
larga envergadura que só a
nível muito superior poderão ser decididas.
— Importa no entanto apresentá-las e ampará-las, não apenas
porque são válidas,
mas ainda porque constituem uma toma da de posição oportuna,
dos Serviços, que
doutra forma poderão vir a ser acusados de terem ignorado o
problema, apesar de para
o mesmo haverem sido alertados.
-Afirmamos a convicção de que o futuro da sobrevivência da
fauna bravia em
Moçambique — na medida em que venha a processar em ritmo
acelerado, como convém
e se impõe, o desenvolvimento do seu território através de
actividades agro-pecuárias
e industriais — só poderá ser viável se forem estabelecidos
antes disso, os necessários
Parques e Reservas com as áreas absolutamente vedadas a
quaisquer outros fins.
— Assim, acarinhamos a ideia da necessidade de,
imediatamente, serem tomadas
medidas decisivas no sentido de: Ou criar uma estrutura de
Parques e Reservas
com autêntica base cientifica, da qual resultaria evidente
valorização do património
natural de Moçambique, e consequente prestígio internacional
nos meios ligados
ao assunto; Ou manter as actuais estruturas — na verdade
demasiado empíricas e
constrangedoramente "amadoras", mas certamente
adequadas aos meios disponíveis
— correndo-se o risco, no futuro, de nos acusarem, e com
razão, de imprevidência na
execução de medidas que nos cabe praticar no campo da
protecção da natureza"
Terminávamos então propondo:
"— Que sejam adoptadas as seguintes medidas resultantes
do relatório do Dr.
K.L.Tinley, cuja execução será posta em prática,
evidentemente, a medida que forem
sendo obtidos os meios necessários para o efeito:
1
— Inclusão da Serra da Gorongosa na área do Parque Nacional
da Gorongosa.
2
— Retirada gradual das populações ali fixadas.
3
— Alteração do projecto da estrada nacional nº1,no troço
compreendido
entre Vila Paiva e Maringue por forma a que siga o lado
oeste da serra. A — Colocação
da área da Coutada nº10 e do enclave de Cheringoma em regime
de reserva total, com
impedimento de nelas serem autorizados quaisquer projectos
de aproveitamento ou
fixação de polos de povoamento com vista à sua posterior
inclusão no Parque Nacional da
Gorongosa.
"- Esta informação e o relatório que lhe deu origem,
foram apreciados em reunião do
Conselho de Governo, presidido pelo Governador Geral
Baltazar Rebello de Sousa, e
daí resultou um despacho sancionando, na generalidade, as propostas
apresentadas e
nomeando as diversas comissões para tratar dos pormenores
mais particularizados.
"- No entanto, somente em 1 de Julho de 1971, já sob a
presidência do Governador-
Geral Eng. Arantes e Oliveira, se realizou uma reunião de
alto nível, à qual assistimos
também e secretariámos, e em que foram estabelecidos as
seguintes conclusões:
A — Conclusão relativa ao aspecto faunístico:
A Direcção dos Serviços de Veterinária, com a colaboração
do Governo do Distrito
da Beira, continuará e incrementará a valorização do Parque
Nacional da Gorongosa no
aspecto da protecção da natureza e que se podem resumir nos
seguintes pontos:
1
— Alteração dos limites do Parque para os propostos pelo Dr.
Tinley, com os
necessários ajustamentos.
2
— Deslocação progressiva das populações da região de Goínha
e Nhantaze,
preparando-se para estas as necessárias infra-estruturas
sócio-económicas em locais
adequados.
3
— Na Serra da Gorongosa não se fará deslocação das
populações mas sim uma
maior fiscalização, defesa e protecção das nascentes de água
e apoio e ensino às
populações, de forma a evitar a erosão.
4
— Deslocação para fora dos limites do Parque da Missão e
cantina ali existentes;
5
— Estudo e resolução das concessões existentes dentro do
Parque.
Sua Excelência o G.G. frisou e determinou que, na deslocação
das populações se
deveria evitar, por todos os meios, formas de actuação que
provocassem qualquer espécie
de atritos com as mesmas.
B — Conclusão relativa aos acessos:
1
- Desvio da estrada nacional n° 1 de Vila Paiva para
Maringué, passando esta a
poente da Serra;
2
- Melhoria dos acessos — Vila Paiva e Inhaminga;
3
— Melhoria do campo de aviação existente em Vila Paiva, mas
não sendo de
encarar atribuir-lhe voos alem dos de "Friendship".
4
- Estudo e possibilidades de acesso pelo rio Punguè, como
atractivo turístico.
C - Conclusão de natureza turística:
Na falta de recursos financeiros e de planos detalhados para
o aproveitamento
turístico do Parque, será de encarar a entrega do estudo,
posterior execução do
empreendimento e exploração turística do Parque a entidades
privadas, mas sempre
com a intervenção da Administração, quer na orientação a
dar-se ao estudo quer na
realização de capitais.
Como orientação fundamental deste estudo haverá que encarar,
primordialmente, os
aspectos ligados à protecção da natureza. (0 G.G., o
Secretário Provincial da Economia,
ficaram de, pessoalmente, estabelecer contactos nesse
sentido com entidades
financeiras, nomeadamente B.N.U., Instituto de Crédito,
Grupo CUF e outros).
D — Conclusão sobre ampliação e melhoria do acampamento do
Chitengo:
Foi reconhecido, independentemente do estudo e futura
valorização turística do
Parque, a necessidade imediata da ampliação e melhoria do
actual acampamento do
Chitengo, tendo em vista a enorme afluência de turistas que
actualmente se verifica,
e que ali se não podem alojar. Acordou-se ainda que esta
ampliação deveria ser de
carácter rústico, e de acordo com o meio ambiente. As mesmas
características deverão
ser imprimidas a futuros acampamentos.
Recordemos que, a esta Reunião de l/Julho/971, assistiram
além do Governador
Geral Arantes e Oliveira, os Secretários Provinciais de
Terras e Povoamento, da
Economia, das Obras Publicas, o Governador de Distrito da
Beira, o Director do Centro
de Informação e Turismo e o autor destas linhas em
representação da R.T. da Fauna da
Direcção dos Serviços de Veterinária).
Recordemos ainda que, nessa altura, começaram a surgir na
Beira, e na área do
seu Distrito, problemas agudos relacionados com a expansão
da Luta de Libertação
Nacional, que então havia chegado à região. Daí resultaram,
sem dúvida, duas atitudes
governamentais que vieram a decidir a forma como se
encaminhou a implementação
das "conclusões" contidas no documento que atrás
recordamos:
1 - A de manter o Parque - e mantê-lo aberto - como
expressão de soberania colonial
e de prestígio, uma vez que o número dos seus habitantes
aumentou substancialmente.
2 - Desenvolver actividades de ordenamento das populações,
através dos
conhecidos "aldeamentos", alguns dos quais foram
projectados e iniciados em áreas
pertencentes ao Parque e, por outro lado, uma atitude
"paternalista" que levou a considerar
os programas da protecção à fauna como causadores directos
de descontentamento das
populações e, portanto, favorecendo a "subversão".
As providencias que então foram tomadas, podem resumir-se
pela forma seguinte:
"1 - A questão de estudo e implantação dos novos
limites, - claro que sem considerar na
totalidade o projecto do Dr. Tinley — foi entregue ao
Gabinete de Estudos Agrários, a cargo
de burocratas desligados da Fauna, e de cujos trabalhos não
chegaram a ser aprovados os
resultados: portanto os limites anteriores foram mantidos ;
2— A deslocação das populações de Goínha e Nhandaze, foi
igualmente entregue
àquele Gabinete de Estudos Agrários, com a colaboração da
chamada "Junta de
Povoamento" e, depois de consumidas avultadas verbas,
nada de concreto resultou
também, continuando as populações onde e como se
encontravam.
3— A Serra da Gorongosa não foi incluída e, antes pelo
contrário, foi sistematicamente
invadida, nas suas vertentes e margens dos rios pelas populações
que pretendiam fugir aos
aludidos "aldeamentos", não se fazendo portanto
qualquer fiscalização, defesa e protecção
das nascentes.
A — As cantinas e concessões existentes, foram, de facto,
retiradas do Parque e os
seus proprietários amplamente indemnizados.
5- A estrada nacional n° 1 tem o seu traçado alterado e isso
resultou, na verdade, num
grande benefício para o Parque, o único, positivo, que terá
saído de toda aquela grande
movimentação de meios.
6- Os acessos a Vila Paiva e Inhaminga não sofreram qualquer
melhoramento.
7-O campo de aviação de Vila Paiva não foi melhorado e,
portanto,
os "Friendships" continuaram a não poder la
aterrar...
8- E, finalmente, não se fez estudo da possibilidade de
acesso ao Parque por
barco, pelo rio Pungue, não tendo esta ideia passado de uma
optimista e remota
possibilidade.
9- Não conhecemos qualquer resultado positivo dos contactos
que possam
ter havido entre o Governo e entidades privadas e entidades
financeiras para
melhoramento das infra-estruturas turísticas embora seja
certo que algumas
iniciativas foram esboçadas para a construção de grandes
acampamentos turísticos,
nomeadamente em Bué Maria. (por parte da Safrique), e na
nova ponte sobre o rio
Pungué (por parte doutro grupo financeiro).
10 —Igualmente, também, nada se faz para ampliar e valorizar
as velhas
instalações do Chitengo, nem com carácter rústico nem com
qualquer outro... e,
portanto, tudo quanto fora resolvido não país sou do papel
onde foi registado...
Entretanto, entravamos já em 1972 e o Administrador do
Parque, Dr. Romão,
abandonou o lugar e foi imediatamente substituído por um
jovem médico veterinário,
recém diplomado na Faculdade de Veterinária do então
Lourenço Marques, o
Dr. Albano Cortez. Esta nomeação revela que se continuava a
menosprezar os
verdadeiros interesses do Parque, da fauna bravia e da
conservação da natureza,
entregando a direcção de assuntos tão importantes a um
técnico que havia recebido
preparação — mas para tratar e criar animais domésticos -
ainda sem qualquer prática.
No entanto, como sempre, prevaleceu a opinião dos mais altos
dirigentes, contra o que
pensavam os poucos, realmente, ligados à fauna e ao Parque.
Por essa altura a guerra de libertação atingiu mesmo a
região de Gorongosa e
Inhaminga e, mais uma vez contra a opinião dos responsáveis
mais directos pela
fauna, os governantes decidiram que o Parque — grande polo
de prestígio — deveria
manter-se aberto ao turismo, devendo para isso
implementar-se a necessária defesa
que assegurasse a tranquilidade dos visitantes.
E então assistimos - impotentes para lhe opor qualquer
resistência que fosse além
das palavras e das ideias - ao es
tabelecimento, no Parque Nacional da Gorongosa dos seguintes
dispositivos militares
e afins:
a) -
No Chitengo, ficou instalada uma Companhia de tropa
portuguesa, com a
missão de defender, militarmente, e dentro da estratégia
geral da região, a área do
Parque.
b) -
A Organização Provincial de Voluntários (O.P.V.).foi
encarregada de velar
pela segurança do acampamento do Chitengo, dos Postos de
Fiscalização e da
segurança dos turistas.
Fácil é compreender a confusão reinante no Chitengo,
transformado em quartel e,
ao mesmo tempo, sempre cheio de turistas...
Além disso, o grupo da O.P.V., recrutado na então cidade de
Lourenço Marques,
era composto por elementos marginais oriundos das piores
alfurjas da capital. E os
seus comandantes não eram muito melhores revelando-se todos,
e por isso, como
inimigos do Parque e da fauna, caçando desenfreadamente para
se alimentarem ou
para negócio, estragando viaturas e material e
indisciplinando e confundindo ainda
mais as populações residentes.
Foi um período mau, muito mau mesmo, e que só veio a
terminar com a
Independência Nacional.
Apesar de tudo isto — direi melhor, e mesmo com tudo isto —
o Parque conseguiu
vencer, resistir e manter-se! Não temos dúvidas de que,
especialmente devido ao seu
valor intrínseco.
Nos tempos da nossa ligação directa ao Parque, quando algum
visitante nos
abordava — antes de percorrer as picadas, ou mesmo ainda na
Beira, antes de
conhecer a Gorongosa, mas tendo dela já uma ideia lendária e
de propaganda —
ansioso por adivinhar como decorreria a sua visita (se teria
sorte, se o Parque,
naquela época estava bom, se continuava a haver muitos
animais, se o acampamento
servia bem, etc.), nos respondíamos sempre, mais ou menos,
assim: Vá o Sr.
tranquilo, pois no Parque há uma "entidade" que
cumpre sempre a sua obrigação para
com os turistas, e essa entidade são precisamente os animais,
que, tenho a certeza,
não o deixarão desiludido.
Quanto ao resto... bem, aquilo que depende do homem revela
bastante
insuficiências e imperfeições, mas há que compreendê-las!
(ARQUIVO. Maputo (Moçambique), 6: 211-238, Outubro de 1989.)
* * * * *
* * *
*
(*) - O período a que o autor de se refere está errado. O correcto é 1965/1967. Neste último ano entrou em funções do Dr. Francisco Prestes Romão, médico veterinário, que foi o primeiro Administrador residente do PNG. (NOTA DO ADMINISTRADOR DO BLOG)
Ver também em:
- III -
2010 - Departamento de Comunicação do PNG
Compilação de dados históricos a partir de 1920 até 2003 e informações sobre a restauração do Parque (período de 2004 a 2010) pelo Projecto subsidiado pela Fundação Carr e dirigido pelo seu presidente, o filantropo americano Greg Carr.
Este conjunto de dados, abaixo inseridos, encontra-se publicado na Web Site oficial do PNG:
História
Origens
1920-1940
Desde muito cedo a paisagem dramática e a rica fauna bravia da região da
Gorongosa atraíram caçadores, exploradores e naturalistas. O acto oficial com
vista a proteger este esplendor apareceu pela primeira vez em 1920, quando a
Companhia de Moçambique ordenou que 1.000 quilómetros quadrados fossem
conservados como uma Reserva de Caça para os administradores da companhia e
seus visitantes. A Companhia controlava toda a região central de Moçambique
entre 1891 e 1940, tendo sido esta área concedida pelo Governo de Portugal.
Pouco se conhece sobre os primeiros anos da Reserva,
com excepção de que a partir de uma dada altura, um certo homem de nome José
Ferreira começou a residir numa casa coberta de colmo no Chitengo incumbido
de proteger a fauna bravia. Em 1935, o Sr. José Henriques Coimbra foi
designado administrador e o senhor Ferreira tornou-se no primeiro guia
turístico. Naquele mesmo ano, a Companhia de Moçambique alargou o espaço da
Reserva para uma área de 3.200 quilómetros quadrados para proteger o habitat de
Inhalas (uma espécie de antílopes) e Rinocerontes pretos, ambos troféus
de caça muito apreciados.
Uma carta escrita por um oficial da Companhia de
Moçambique em 1935 mostra claramente que nos primeiros anos, a Reserva era para
um pequeno grupo de caçadores, e não propriamente um santuário de vida
selvagem. “Uma visita à Beira será em breve feita pelo Cruzador Britânico
CARLISLE, que consistirá numa jornada de caça para os respectivos oficiais nas
planícies abertas de Gorongosa,” assim escreveu o oficial para o administrador
local.
Recomenda-se que o Administrador tome as medidas
necessárias de modo a garantir que os ilustres visitantes não encontrem os
animais muito excitados ou dispersos, o que tornaria difícil o êxito da caçada.
Em 1940, a Reserva já se tornara bastante famosa, uma
nova administração e um campo turístico foram construídos nas planícies perto
do Rio Mussicadzi. Infelizmente este sítio teve que ser abandonado dois anos
mais tarde, devido a grandes cheias na época das chuvas. Os leões tomaram conta
das construções abandonadas e o lugar tornou-se num grande atractivo turístico
por muitos anos, conhecido com o nome de Casa de Leões.
1941-1959
Depois do término do contrato da Companhia
de Moçambique, a gestão da Reserva passou para as mãos do governo colonial. Sob
a administração do Capitão Pinto Soares, o fiscal Alfredo Rodrigues tomou os
primeiros passos oficiais com o objectivo de banir as caçadas e de estabelecer
um negócio turístico viável.
Em 1951 começaram outras construções de uma nova
administração e acomodações no Chitengo, incluindo um restaurante e um bar. No
mesmo ano, o governo aumentou mais 12.000 quilómetros quadrados da zona de
protecção à volta da Reserva para mitigar os impactos da estrada da Beira para
Rodésia, que passava por Chitengo. Até aos finais de 1950 mais de 6.000
turistas visitavam anualmente a Reserva e o governo colonial tinha atribuído a
primeira concessão de turismo no Parque.
Em 1955, o governo colonial decretou que a Divisão dos
Serviços de Veterinária assumisse o controlo sobre a gestão de toda a fauna e
flora bravia em Moçambique, incluindo a Gorongosa. A Gorongosa foi nomeada
Parque Nacional pelo governo português,
em 1960.
O Apogeu
1960-1980
Em 1960, após reconhecer que a reserva necessitava de mais
protecção ecológica formal e mais instalações para a actividade turística
crescente, o governo português declarou a reserva e mais 2.100 quilómetros
quadrados de terra (um total de 5.300 quilómetros quadrados), um Parque
Nacional.
O novo Parque deu passos significativos de melhorias,
arrancaram construções de estradas e outras infra-estruturas. Entre os anos de
1963 e 1965, as instalações de Chitengo foram alargadas para acomodar pelo
menos 100 turistas. Durante esse período o Chitengo passou a dispor de duas
piscinas, um bar e um salão de festas, um restaurante com capacidade de servir
entre 300-400 refeições por dia, uma estação de correios e uma estação de
abastecimento de combustível, uma clínica para urgências, e uma loja para
vender objectos artísticos locais.
As receitas das licenças de caça e as taxas de caça em qualquer
parte de Moçambique contribuíram para este progresso do Parque. No mesmo
período, a pavimentação da estrada Beira-Rodésia e a construção da ponte sobre
o rio Pungué, em Bué Maria, ajudou a duplicar o número de visitantes.
Igualmente nos finais dos anos 60, realizaram-se os primeiros
estudos científicos básicos do Parque, conduzidos por Kenneth Tinley, um
ecologista sul-africano. Na primeira contagem efectuada com meios aéreos,
Tinley e sua equipe registaram cerca de 200 leões, 2.200 elefantes, 14.000
búfalos, 5.500 bois-cavalos, 3000 zebras, 3.500 pivas, 2.000 impalas, 3.500
hipopótamos e manadas de centenas de elandes, pala-palas e gondongas.
Tinley também descobriu que muitas pessoas e muita vida selvagem
residente dentro e nos arredores do Parque Nacional, depende de um rio, o
Vunduzi, que nasce nas vertentes da montanha de Gorongosa. Porque a montanha
estava fora das linhas fronteiriças do Parque, Tinley propôs a expansão das
fronteiras, de maneira a incluir a montanha por ser o elemento chave do Grande
Ecossistema da Gorongosa, com cerca de 8.200 quilómetros quadrados. Ele e
outros cientistas e conservacionistas ficaram desapontados em 1966 quando o
governo reduziu a área do Parque para 3.770 quilómetros quadrados. A razão
oficial para a redução era porque os camponeses locais precisavam de mais
terras para suas práticas agrícolas. Tinley viu a situação de outra maneira. Ao
apontar para o desaparecimento de muita vida selvagem em várias zonas circunvizinhas,
ele acreditou que a razão verdadeira da redução da área do Parque era para
facilitar o trabalho dos caçadores locais. “A fome deles era de proteínas, e
não de terras,” disse Tinley.
Simultaneamente, Moçambique estava no meio da guerra de libertação
iniciada em 1964 pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo). Felizmente
a guerra teve pouco impacto no Parque Nacional da Gorongosa até 1972, quando
uma Companhia Portuguesa e membros da Organização Provincial de Voluntários se
instalou no Parque para protegê-lo. Nessa altura não foram causados muitos
danos, embora alguns soldados caçassem ilegalmente. Em 1972, enquanto a guerra
estava ainda em curso, o Parque tinha cerca de 200 leões, 14.000 búfalos, 5.500
bois-cavalos, 3.500 hipopótamos, e mais de 2.000 elefantes. Em 1976, um ano
depois de Moçambique estar independente de Portugal, contagens aéras do Parque
e do delta do rio Zambeze indicavam aproximadamente 6.000 elefantes e cerca de
500 leões, provavelmente a maior concentração de leões em toda África.
Em justo reconhecimento do progressivo desenvolvimento e reputação
da fauna do Parque e da importância de conservar este bem em Moçambique, em
1981, o governo da Frelimo escolheu o Parque para acolher a Primeira
Conferência Nacional sobre a Fauna Bravia.
A Guerra Civil
1981-1994
A paz em Moçambique não foi duradoira. A África do Sul começou a
financiar e armar uma tropa de rebeldes para desestabilizar Moçambique. Em
Dezembro de 1981, pela primeira vez, o Parque Nacional da Gorongosa sentiu a
pesada fúria da guerra, quando os soldados da Resistência Nacional de
Moçambique (RENAMO) atacaram o acampamento de Chitengo e raptaram muitos dos
seus trabalhadores, incluindo dois cientistas estrangeiros.
A partir daquela data, a violência dentro e nos arredores do
Parque aumentou. Em 1983, o Parque foi encerrado e abandonado. Durante nove
anos, o Parque Nacional foi palco de frequentes batalhas entre as forças
opostas. A violenta batalha terrestre, e os bombardeamentos aéreos
destruíram todas as construções. Os grandes mamíferos do Parque sofreram
terrível destruição. Os dois beligerantes dizimaram centenas de elefantes para
retirar o marfim, que vendiam para obtenção de mais armas e outros equipamentos
bélicos. Soldados famintos mataram muitos milhares de zebras, bois-cavalos,
búfalos e outros animais ungulados. Os leões e outros grandes predadores foram
mortos em caçadas desportivas ou morreram por fome por causa do desaparecimento
das suas presas.
Ao mesmo tempo, muitas pessoas residentes dentro e nos arredores
do Parque foram mortas ou espancadas, especialmente pela RENAMO, já nos últimos
anos da guerra, quando grande parte do distrito de Gorongosa estava sob
controlo dos rebeldes. Muitos refugiaram-se dentro do Parque. Famintos de
carne, caçavam a seu belo prazer, contribuindo assim para aniquilamento da
fauna bravia.
A guerra civil terminou em 1992, mas a caça furtiva no Parque,
principalmente por caçadores vindos da Beira, continuou por mais dois anos. Por
essa altura, as enormes populações de mamíferos de grande porte, incluindo
elefantes, hipopótamos, búfalos, zebras e leões, já tinham sido reduzidos em
90% ou mais. Felizmente, as espectaculares aves do Parque saíram relativamente
ilesas.
A Recuperação
1995-2003
O esforço preliminar para reconstruir a infra-estrutura do Parque
Nacional da Gorongosa e restaurar a sua vida selvagem começou em 1994, quando o
Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) iniciou um plano de reabilitação - com
a assistência da União Europeia e da União Internacional para a
Conservação da Natureza (IUCN). Foram contratados 50 funcionários novos, a
maior parte deles, ex-combatentes.
Baldeu Chande e Roberto Zolho, ambos empregados do Parque antes da
guerra, voltaram para assumir cargos de liderança. Chande era director do
programa de emergência e Zolho era coordenador da fauna e flora bravias, assim
como da fiscalização. "Concluímos que todas as espécies que havia no
Parque antes da guerra ainda existem", afirmou Chande a um repórter em
1996. "Nenhuma se encontra extinta mas muitas estão representadas em muito
menor número do que antes."
Num período de cinco anos, esta iniciativa do BAD reabriu cerca de
100 km de estradas e caminhos e formou fiscais na luta contra a caça ilegal.
Começar de Novo
De 2004 ao Presente
Em 2004, o Governo de Moçambique e a Carr Foundation, com sede nos
EUA, acordaram unir esforços no sentido de reconstruir a infra-estrutura do
Parque, restaurar a sua fauna e flora bravias e estimular o desenvolvimento
económico, dando assim início a um novo e importante capítulo da história do
Parque.
Entre 2004 e 2007, a Carr Foundation investiu mais de dez milhões
de dólares neste esforço. Durante este período, a equipa do projecto de
restauração do Parque criou um Santuário de Fauna Bravia de 6.200 hectares e
reintroduziu búfalos e bois-cavalos no ecossistema. Também foi nesta altura que
se começou a restaurar o Acampamento de Chitengo.
Dado o sucesso deste projecto inicial de três anos, o Governo de
Moçambique e a Carr Foundation (que passou a designar-se "Gorongosa
Restoration Project") anunciaram em 2008 a assinatura de um acordo para
restaurar e co-gerir o Parque nos próximos 20 anos.
A dedicada equipa de cientistas, engenheiros, gestores de negócio,
peritos em economia e programadores de turismo que agora trabalha na
restauração do Parque Nacional da Gorongosa está confiante de que com trabalho
árduo, com o desenvolvimento da população local e com os rendimentos
provenientes do ecoturismo, esta zona espectacular irá reencontrar a glória que
teve em tempos.
Em Julho de 2010, o Governo de Moçambique decidiu alterar os
limites do Parque Nacional da Gorongosa e incorporar a Serra da Gorongosa
(acima dos 700 metros) dando assim satisfação a uma velha aspiração que tinha
sido apresentada nos anos 60 pelo então ecologista do PNG, Kenneth Tinley.
O Parque passou a ter uma área de 4.067 quilómetros quadrados e o
Governo decidiu também estabelecer oficialmente uma zona tampão com cerca de
3.300 quilómetros quadrados.
- IV -
2010 - WIKIPÉDIA
COMPILAÇÃO E PUBLICAÇÃO DE DADOS NO SITE OFICIAL DESTA ENCICLOPÉDIA VIRTUAL
Parque Nacional da Gorongosa
Reencaminhado a partir de Gorongosa · Ponto de referência
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